quinta-feira, 12 de abril de 2012


O Livro e a América

Talhado para as grandezas, 
Pra crescer, criar, subir, 
O Novo Mundo nos músculos 
Sente a seiva do porvir. 
— Estatuário de colossos — 
Cansado doutros esboços 
Disse um dia Jeová: 
"Vai, Colombo, abre a cortina 
"Da minha eterna oficina... 
"Tira a América de lá".

Molhado inda do dilúvio, 
Qual Tritão descomunal, 
O continente desperta 
No concerto universal. 
Dos oceanos em tropa 
Um — traz-lhe as artes da Europa, 
Outro — as bagas de Ceilão... 
E os Andes petrificados, 
Como braços levantados, 
Lhe apontam para a amplidão.

Olhando em torno então brada: 
"Tudo marcha!... Ó grande Deus! 
As cataratas — pra terra, 
As estrelas — para os céus 
Lá, do pólo sobre as plagas, 
O seu rebanho de vagas 
Vai o mar apascentar... 
Eu quero marchar com os ventos, 
Com os mundos... co'os 
firmamentos!!!" 
E Deus responde — "Marchar!" 
 
"Marchar! ... Mas como?...  Da Grécia 
Nos dóricos Partenons 
A mil deuses levantando 
Mil marmóreos Panteon?... 
Marchar co'a espada de Roma 
— Leoa de ruiva coma 
De presa enorme no chão, 
Saciando o ódio profundo. . . 
— Com as garras nas mãos do mundo,

— Com os dentes no coração?... 
"Marchar!... Mas como a Alemanha 
Na tirania feudal, 
Levantando uma montanha 
Em cada uma catedral?... 
Não!... Nem templos feitos de ossos, 
Nem gládios a cavar fossos 
São degraus do progredir... 
Lá brada César morrendo: 
"No pugilato tremendo 
"Quem sempre vence é o porvir!"

Filhos do sec’lo das luzes! 
Filhos da Grande nação! 
Quando ante Deus vos mostrardes, 
Tereis um livro na mão: 
O livro — esse audaz guerreiro 
Que conquista o mundo inteiro 
Sem nunca ter Waterloo... 
Eólo de pensamentos, 
Que abrira a gruta dos ventos 
Donde a Igualdade voou...

Por uma fatalidade 
Dessas que descem de além, 
O sec'lo, que viu Colombo, 
Viu Guttenberg também. 
Quando no tosco estaleiro 
Da Alemanha o velho obreiro 
A ave da imprensa gerou... 
O Genovês salta os mares... 
Busca um ninho entre os palmares 
E a pátria da imprensa achou...

Por isso na impaciência 
Desta sede de saber, 
Como as aves do deserto 
As almas buscam beber... 
Oh! Bendito o que semeia 
Livros... livros à mão cheia... 
E manda o povo pensar! 
O livro caindo n'alma 
É germe — que faz a palma, 
É chuva — que faz o mar.

Vós, que o templo das idéias 
Largo — abris às multidões, 
Pra o batismo luminoso 
Das grandes revoluções, 
Agora que o trem de ferro 
Acorda o tigre no cerro 
E espanta os caboclos nus, 
Fazei desse "rei dos ventos" 
— Ginete dos pensamentos, 
— Arauto da grande luz! ...

Bravo! a quem salva o futuro 
Fecundando a multidão! ... 
Num poema amortalhada 
Nunca morre uma nação. 
Como Goethe moribundo 
Brada "Luz!" o Novo Mundo 
Num brado de Briaréu... 
Luz! pois, no vale e na serra... 
Que, se a luz rola na terra, 
Deus colhe gênios no céu!...
                                                               
Castro Alves 

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